Previdência e Crescimento

O Brasil entrou em março de 2019, discutindo os mesmos problemas que já se faziam claros e urgentes em meados de 2013. Reforma da previdência, ajuste fiscal, correção da trajetória de crescimento do gasto público, PEC do Teto dos Gastos, utilização de receitas não recorrentes para fechamento de exercícios fiscais, crime de responsabilidade de Dilma, contabilidade criativa, desajuste federativo; enfim, existe uma verdadeira dominância fiscal na pauta do debate público sobre a economia brasileira – é bem verdade que problemas fiscais não são “privilégio” da economia brasileira e, mundo a fora, países apresentam agenda semelhante.

Algumas coisas devem ser ditas sobre isto. Primeiro, da mesma forma como os problemas fiscais do Brasil não se resolveram com a queda na taxa SELIC e da inflação, e o suposto alívio nos gastos abaixo da linha com juros e amortizações, também não se resolveram com aprovação da PEC do teto dos gastos, os assuntos fiscais nacionais não serão resolvidos com a aprovação da reforma da previdência. Tão pouco a previdência sairá da agenda nacional da próxima década, tamanhas as transformações do perfil demográfico do Brasil. A reforma da previdência é um passo, entre muitos outros, para impedir um colapso financeiro da nossa dívida pública, no horizonte de curto prazo.

Além da reforma da previdência, um conjunto de novas ações no campo fiscal deverão ser implementadas por este e pelos próximos governos, revisão de regimes tributários especiais para setores produtivos, revisão de planos de cargos e carreiras no serviço público estatutário, principalmente para Estados e municípios, existe ainda uma agenda de desindexação do gasto público, para que volte haver margem no país para crescimento das despesas de capital. Enfim, existe uma agenda extensa a ser implementada no curtíssimo prazo. Um segundo ponto que precisa, no entanto, ser considerado, é que em que pese as baixas taxas de crescimento da economia brasileira, as reformas fiscais devem ser implementadas muito mais em função do seu caráter preventivo, do que como uma agenda de crescimento e desenvolvimento.

O Brasil cresceu 1,1% em 2018, considerando o histórico da economia brasileira, entre 1900 e 2018, a taxa média crescimento foi de 4,58%, sendo que a partir de 1981, esta taxa média reduziu para 2,09% ao ano. Ao considerar a década em curso, a taxa média de crescimento da economia brasileira fora de ridículos 0,13% ao ano entre 2011 e 2018. Existe, portanto, um problema posto, é verdade que desde 2008 o mundo cresce menos e isto repercute na economia doméstica, no entanto, existe uma patologia posta, uma espécie de doença que faz com que década após década, as taxas médias de crescimento da economia brasileira sejam menores em relação à média de longo prazo da economia brasileira.

A solução para o problema do crescimento da economia brasileira, requer uma agenda específica e de longo prazo, vai muito além do manuseio de políticas de controle de demanda no curto prazo. É preciso atuar sobre o lado da oferta, é preciso tratar de de desenvolvimento humano, de produtividade, educação, de comércio internacional (mesmo que o mundo esteja temporariamente hostil à esta pauta), é preciso falar de infraestrutura, de segurança jurídica, de marco regulatório, de papel dos bancos públicos, de formação de poupança doméstica. Em resumo, é preciso falar de instituições. É preciso inclusive abandonar as velhas ideias que produziram desequilíbrios e pobreza ao país.

Muitos economistas tem apresentado o problema da produtividade, relacionando com as dificuldades para dentro e para fora da firma. No que se refere aos desafios porta para dentro, temos um trabalhador médio que produz 1/4 da produção de um trabalhador alemão ou americano que desempenha atividade semelhante. Isto está relacionado com as deficiências no nosso ensino básico e médio, com a insuficiência do nosso ensino técnico, e com um ensino superior de qualidade razoável, mas voltado predominantemente para formar profissionais para setores cujos rendimentos marginais são decrescentes, como serviços e agricultura. Some a isto uma quantidade inimaginável de horas para planejar, contabilizar e pagar tributos.

Já no se refere à porta para fora da firma, temos uma economia fechada, cujo acesso à bens e serviços de melhor qualidade e mais baratos é restrito; existe na soma da comunidade europeia, Estados Unidos e China um mercado total de uma renda aproximada US$47 trilhões, para os quais as empresas nacionais deveriam estar produzindo e vendendo, mas sob o pretexto de proteger a indústria brasileira, opta-se por restringi-las ao mercado doméstico de US$1,5 trilhão, e a competição é um fator de elevação da produtividade. Mas não é o único fator: com exceção de São Paulo, a infraestrutura do país dificulta a integração interna e externa, torna caro o transporte, a energia, o abastecimento de água, some-se a isto a insegurança jurídica causada por regras que se alteram constantemente, a fragilidade do marco regulatório, as dificuldades para se obter patentes inibem as inovações.

Enfim, estes são os problemas a serem enfrentados, esta é a agenda que vai devolver ao país taxas robustas de crescimento por um período prolongado. As reformas fiscais são importantes, para evitar turbulências mais sérias, mas não são capazes, sozinhas, de retomar o crescimento.

Benito Salomão Doutorando em Economia pela Universidade Federal de Uberlândia Contatos: basalomao@benitosalomao.com.br www.benitosalomao.com.br
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