Um dos eventos mais marcantes da minha infância e de muitos dos meus contemporâneos foi a morte de Ayrton Senna. O piloto era o grande ídolo nacional, especialmente pela forma como fazia questão de carregar a bandeira do Brasil nas suas muitas vitórias, numa época sem conquistas no futebol e com a economia disfuncional. Sua morte foi uma verdadeira tragédia, assistida ao vivo por milhões de espectadores ao redor do mundo. Na despedida, um sem número de pessoas tomou as ruas por onde o cortejo passou e, novamente, lá estava o pendão verde e amarelo. Senna é, inquestionavelmente, um grande símbolo do Brasil.
Quatro anos antes, houve outra tragédia brasileira, ínfima se comparada à perda do nosso piloto tricampeão mas, ainda assim, bastante doída. Nossa seleção foi eliminada da Copa da Itália pelos nossos grandes rivais argentinos, graças a uma jogada fenomenal de Diego Maradona. Com a morte desse grande craque, nós, brasileiros, prestamos as maiores reverências ao seu talento sublime, intercaladas com ressalvas sobre aspectos negativos de sua personalidade marcante.
Senna era totalmente obcecado pelo máximo. Prova disso é a batida que sofreu no GP de Mônaco de 1988, quando liderava com mais de 50 segundos de vantagem para o segundo colocado. Ele não queria simplesmente ganhar, ele queria ser o melhor possível. Para tal, estava disposto a doar-se integralmente, sem atalhos ou gambiarras.
Maradona não se dedicava aos treinos e nem era cuidadoso com sua saúde. Seu dom extraordinário permitia que jogasse em altíssimo nível, mas ele não fazia esforço para ir além e chegar ao seu limite. Além de ser desregrado, em diversas ocasiões, o argentino burlou as regras do jogo, como no gol de mão na Copa de 86, na água batizada para o nosso lateral Branco na Copa de 90 e no doping na Copa de 94.
Apesar de idolatrarmos o nosso piloto tricampeão, o Brasil, enquanto nação, é muito mais parecido com Maradona. Nascemos com um enorme talento, na forma de riquezas naturais, terras férteis, clima favorável, paisagens deslumbrantes e tudo mais. Porém, no que depende de nós, fracassamos miseravelmente. Não fomos capazes de desenvolver as instituições necessárias para converter esse potencial em potência. Somos viciados no atraso. Incapazes de tomar as decisões difíceis, perdemos décadas buscando atalhos. Para cada novo problema que surge, aparece um jeitinho que nunca dá jeito. Na nossa brasilidade, burlamos todas as leis possíveis, exceto a lei do menor esforço.
O resultado disso é que nossos indicadores de produtividade continuam nos mesmos níveis de quando Senna e Maradona brilharam nas pistas e gramados, sem boas razões para acreditarmos que isso tende a mudar na década que se inicia. Nosso talento natural não nos levará além do ponto onde estamos. Ou seguimos o exemplo de Ayrton e abraçamos os sacrifícios que temos que fazer para podermos evoluir, ou estaremos fadados a vivermos uma triste história, que lembra o final da carreira de Don Diego.
João Marco Braga da Cunha
Economista