O PIB do primeiro trimestre apontou retração da economia brasileira na ordem de 0,2%, frente ao quarto trimestre de 2018. Isso não foi um fato aleatório, ou ainda um produto do acaso, do destino que teima em importunar o país com o infortúnio de sucessivas crises, condenando-o ao subdesenvolvimento.
Por mais cômodo que se aparente, atribuir causas externas ao desempenho pífio que o país está apresentando, na verdade, a culpa do baixo crescimento é do conjunto do país. Períodos longos e agudos de crescimento negativo deixaram de ser acidentes esporádicos e se tornaram, episódios frequentes.
Vamos aos dados: observando as taxas médias de crescimento do PIB, dados do PIB a preços de mercado divulgados pelo IBGE, entre o primeiro trimestre de 1996 e o primeiro trimestre de 2019, verifica-se:
- Taxa média de crescimento da economia brasileira de 2,27% ao trimestre;
- No entanto, ao recortar a amostra para a década em curso, entre o primeiro trimestre de 2011 e o atual trimestre: esta taxa foi de: 0,59%;
Sendo que, neste período, observou-se um recorte de 11 trimestres consecutivos de PIB negativo, entre o 2° trimestre de 2014 e o 4° trimestre de 2016.
É possível analisar o crescimento da economia segundo dois componentes. O primeiro é relacionado ao potencial de longo prazo. Isso é, a partir do arranjo institucional do país, qual o potencial (ou tendência) de crescimento desta economia?
O segundo componente chama-se ciclo econômico e corresponde às flutuações de curto prazo que a economia apresenta em volta da tendência¹. O gráfico 1 ilustra este problema. A linha vermelha que cruza os dados é uma linha de tendência, que corrobora com o argumento de que as taxas de crescimento menores, apresentadas na presente década, não são uma fase do ciclo e sim da tendência de longo prazo.
Mas, assumindo que o comportamento do produto está relacionado à tendência de redução da capacidade de crescimento, qual a causa efetiva do desempenho medíocre que o país apresenta por quase uma década?
Esta é uma pergunta que não apresenta uma resposta única, tampouco consensual. A literatura universalmente debatida sobre este assunto aponta que o crescimento de longo prazo depende de três fatores:
- Capacidade da economia em acumular capital;
- Fatores demográficos, que influenciam a oferta de trabalho nesta economia;
- Produtividade média dos dois primeiros fatores, isso é, a capacidade de uma mesma combinação de capital e trabalho entregar um maior nível de produto ao longo do tempo²;
Evitando delongas, optei por deixar os fatores trabalho e produtividade para um artigo futuro. O foco deste artigo se dá sobre os efeitos do capital sobre o produto. Dito isso, as baixas taxas de crescimento da economia brasileira estão relacionadas ao desempenho dos demais fatores.
A começar pelo fator capital, tem-se que o estoque de capital de uma economia, num dado momento do tempo, é resultado do fluxo de investimentos realizados nos períodos anteriores e descontados de uma determinada taxa de depreciação do capital.
Novamente, ao observar os dados, verifica-se uma incapacidade crônica da economia brasileira de recuperar o ritmo de investimentos. Considerando o período entre 1996/1 e 2019/1, vê-se que a taxa média de acumulação de capital fixo no Brasil foi de 1,98%. Ao passo que, ao segmentar o período para a década em curso, entre 2011/1 e 2019/1, a taxa média de crescimento dos investimentos foi negativa de 1,76%, como demonstrado no gráfico 2.
Neste ponto, o leitor já deve ter assimilado algumas conclusões:
- É visível que a acumulação de capital causa crescimento econômico;
- Alguma coisa ocorreu na economia brasileira pós-2011. As nossas taxas de formação de capital físico passaram a ser consideravelmente menores quando comparadas ao período anterior;
É importante salientar que os investimentos puxam, além do crescimento, também o emprego. Afinal, quais são os elementos que determinam os investimentos e, consequentemente, a acumulação de capital de uma economia?
Essa não é uma pergunta trivial, já que o investimento é o elemento de demanda mais problemático a ser determinado numa economia. Em função da sua natureza irreversível³, isto é, uma vez que o investimento é empenhado em uma fábrica, equipamento ou obra, esse dinheiro não retorna ao seu proprietário, a não ser na forma de lucro.
Resumindo: o gasto do empresário, hoje, se dá diante da esperança de renda futura, descontado de algum fator de risco. Portanto, na opinião deste humilde discípulo de Adam Smith, os fatores que condicionaram a queda dos investimentos pós-2011 estão relacionadas com um sentimento geral da economia: os investimentos realizados não se convertem em renda futura para o empresário, ou seja, há uma quebra no estado de confiança da economia brasileira.
Uma parte da explicação para esse fenômeno pode ter sido dada pelo elevado número de projetos malsucedidos e que se apresentavam viáveis pré-2011. Isso ocorria em função de uma euforia artificial, bancada por subsídios creditícios e tributários, mas, que se mostraram péssimos negócios quando o dinheiro público que os sustentava acabou.
Todavia, esse fator não explica tudo, já que projetos viáveis e independentes de incentivos públicos, deixaram de ser empreendidos no Brasil. Tal desdobramento ocorreu, principalmente, depois de 2013, quando as taxas de investimento mergulharam em números negativos. Isso pode ser explicado pela elevação dos riscos políticos, econômicos e regulatórios que pairam sobre o Brasil desde então.
Riscos como esses fazem com que os agentes tenham medo do futuro e, com medo, consumam toda sua renda ou, no limite, a entesouram, o que significa guardar o dinheiro sem nenhum retorno financeiro para tanto.
Isso obstrui qualquer tentativa de emprego dos poucos recursos existentes em investimentos produtivos e a retomada do crescimento. É como se o Brasil tivesse caído numa armadilha, onde o presente ruim faz com que as pessoas tenham medo do futuro.
As expectativas negativas quanto ao futuro, geradas a partir do presente, impedem que os agentes gastem, perpetuando a condição precária de baixo crescimento e desesperança. Solucionar esse problema passa pelas respostas que a política econômica do governo nascente dará, com o objetivo de reanimar o humor da sociedade. O Brasil precisa de um choque de reformas.
Benito Salomão
É doutorando em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de Uberlândia, Mestre e Bacharel também em Economia pela mesma universidade. Contato: www.benitosalomao.com.br e basalomao@benitosalomao.com.br
Notas ¹Vide Time to Build and Aggregate Fluctuations, por Finn E. Kydland e Edward C. Prescott. ²Vide A Contribution to the Theory of Economic Growth, por Robert Solow. ³Vide A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, por John M. Keynes.