Em 2012, Fernando Haddad foi eleito pela população paulistana com uma promessa ousada: fazer de São Paulo uma das cidades com mais ciclovias do Brasil melhorando assim, a mobilidade urbana para as pessoas mais pobres.
Já conhece o Curso de Microeconomia do Terraço? Clique aqui!O plano era tentador e ganhou total apoio nas urnas. Ora, quem em sã consciência seria contrário a um projeto tão nobre quanto esse?
Após a construção de centenas de quilômetros de ciclovias, a realidade, entretanto, bateu à porta, qualquer problema de mobilidade urbana estava longe de ter sido resolvida, principalmente nas periferias, onde mal se chegava ciclovia. Era óbvio que o problema havia sido subestimado.
Mas onde estava o erro?
O erro estava em achar que é possível usar uma cidade do tamanho de São Paulo como um grande laboratório urbano, sem ter um conhecimento significativo sobre a realidade dos indivíduos que ali vivem e acreditando que estes irão se comportar de acordo com as convicções ideológicas de um grande planejador central. E isso tem tudo a ver com engenharia social.
Resumidamente, o que eu chamo de engenharia social é a arte de tratar a sociedade como se fosse um grande relógio mecânico, com seus cidadãos agindo como verdadeiras engrenagens em compassos perfeitos, ignorando completamente as relações caóticas e comportamentos imprevisíveis que existem entre os indivíduos.
Os planejadores centrais adeptos a esses preceitos acreditam que basta vontade ideológica para impor seus planos à sociedade, desprezando a atuação de todas as variáveis envolvidas.
Voltando à São Paulo
No caso da capital paulista, foram ignorados fatores óbvios, como: o enorme tamanho da cidade, distâncias absurdas entre os bairros e as regiões empresariais, dificuldade em interligar trechos das ciclovias centrais à periferia, grande quantidade de subidas íngremes, isso sem falar nos dias de alta temperatura, com o trabalhador chegando suado no trabalho, sem chuveiro etc.
Se o objetivo era melhorar a mobilidade do cidadão que mora nas periferias, não é de se surpreender que o projeto em questão se mostrou um desastre. Não é preciso ser um gênio do urbanismo para fazer esse diagnóstico.
E não só isso, o resultado obtido foi o total oposto do esperado. Quem acabou se beneficiando foram os moradores das regiões mais centrais, justo aqueles com os menores problemas de locomoção.
Claro, que depois de um fiasco dessa magnitude, as desculpas que surgem são as mais variadas possíveis: “o paulistano não está capacitado para usar uma ciclovia”, “não houve continuidade do projeto”, “não era bem esse o objetivo do projeto”, “os motoristas são muito agressivos” e por aí vai.
Não é objetivo aqui criticar exclusivamente o então prefeito de São Paulo, até porque projetos dessa natureza são implementados a todo momento em nosso país. A ideia aqui é mostrar que fazer experiências sociais baseadas – seja em ideologias e/ou outras realidades totalmente distintas à nossa, além de gerar um prejuízo financeiro enorme, acabam tirando recursos preciosos de áreas mais carentes de atenção.
Os estragos vão além
O urbanismo, naturalmente, não é única área a sofrer com essas políticas inconsequentes. Quem, por exemplo, nunca teve um amigo que tinha um “esquema” para usufruir do benefício da meia-entrada em eventos tidos como culturais? Todos sabemos o resultado final dessa aberração em forma de lei: ingressos vendidos a metade do dobro do preço.
E a lista de estragos desses planejadores vai longe, num misto de boa vontade e arrogância, eles utilizam a sociedade e toda sua complexa rede de variáveis como um grande laboratório de engenharia social.
Consideram os indivíduos da sociedade como verdadeiros robôs, sem vontade própria e que não irão reagir mediante as novas imposições. É como criar uma estratégia no Xadrez sem considerar a resposta do oponente.
Diante do cenário tortuoso que vivemos, é importante captar quando estamos diante de um autêntico plano de engenharia social, e para isso devemos nos fazer as seguintes perguntas: Quais são as variáveis que podem comprometer o resultado esperado? Elas foram ao menos consideradas? Elas incentivam um comportamento imprevisível por parte dos indivíduos afetados?
Analisando por esse ângulo, ficará mais fácil de entender se estamos diante de um plano com consequências incertas onde o efeito colateral é pior que a doença.
E se ainda assim você ficar na dúvida pense, se fosse o seu dinheiro em jogo, você o arriscaria em algo tão incerto? A não ser que você seja um viciado em apostas, eu acredito que sua resposta será um retumbante, não.
A única diferença é que nossos planejadores centrais fazem essa aposta com um dinheiro que não é deles.
Marcos Rondinelli Formado em Licenciatura em Física pela USP no ano de 2008. Atua profissionalmente na área de TI, e possui grande interesse no estudo de economia e política.