Mercado de apostas esportivas: uma análise da relação risco-retorno sob a ótica do “valor esperado”

Poucas coisas possuem um alcance individual tão extenso como a paixão pelo esporte. Desde países menos desenvolvidos até regiões com ótimos indicadores socioeconômicos, times de diversas modalidades esportivas são amplamente populares e fazem parte da cultura local. Dessa maneira, tal paixão não se traduz somente na prática esportiva, mas também em conversas, reuniões em casa de amigos para assistir jogos e inúmeras outras situações do cotidiano de uma pessoa comum.

Por possuir um alto teor de subjetividade, o esporte permite a existência de diversas opiniões acerca de um mesmo tema. Enquanto os argentinos acreditam que o Maradona foi o maior jogador de futebol já visto, para os brasileiros este título pertence a Pelé. Talvez neste exemplo as opiniões estejam enviesadas pelas paixões nacionalistas, mas, em geral, quanto mais você sabe sobre um esporte, maiores são as chances de você estar correto em suas opiniões e previsões.

Tendo em vista a sua abrangência fenomenal, a sua nuance de subjetividade e a recente disseminação do fácil acesso à internet, não é de se estranhar que esteja havendo um forte crescimento dos sites de apostas esportivas – uma modalidade de investimento financeiro pouco convencional e objeto central do presente texto.

Seja por diversão, por achar que entende muito sobre o assunto ou para ganhar dinheiro, o fato é que sites como Bet365, Bwin e Betfair estão cada vez mais populares. Assim, ganham importância os seguintes questionamentos: será possível realizar bons investimentos nesses sites? Será que o retorno costuma ser condizente com os riscos envolvidos nas apostas?

Para poder responder tais questões, é necessário entender plenamente o funcionamento deste mercado, que, diga-se de passagem, pouquíssimo se assemelha às aplicações financeiras tradicionais, tais como ações ou títulos de renda fixa.

Primeiramente, é essencial frisar que as casas de apostas online operam basicamente da seguinte maneira: para um determinado jogo, há um “cardápio” de diversos eventos possíveis de ocorrer. Para cada evento, o site oferece uma remuneração ao investidor que desejar se aventurar naquela aposta. Obviamente, tal remuneração é maior quando o evento em questão parece ser menos provável de acontecer, afinal, não faria sentido, por exemplo, recompensar igualmente uma pessoa que aposte em uma vitória do Congo contra o Brasil e outra que aposte no contrário.

Tais remunerações oferecidas são chamadas de “odds” e são tipicamente expressas em forma de número decimal. Por exemplo, se a odd para a vitória do Barcelona sobre o Real Madrid está cotada em 3,50, significa que caso se invista 1 real e o Barcelona de fato vença, o prêmio recebido será de 3,50 reais. Em caso de erro no palpite, o investidor perde o seu 1 real apostado.

Dessa maneira, a odd pode ser entendida como o possível retorno do investimento. Logo, para que se possa cumprir o objetivo do presente artigo, basta averiguar se tal remuneração está condizente com o risco incorrido ao realizar a aposta, ou seja, com as chances de erro no palpite.

Mensurar uma relação risco-retorno não é uma tarefa fácil, porém há um conceito utilizado em diversos segmentos da Ciência Econômica que pode ser bastante útil para solucionar (ou pelo menos atenuar) este problema: o “Valor Esperado” (ou “Esperança”).

Como o mundo é extremamente complexo e muitas vezes imprevisível, é natural que frequentemente os indivíduos se deparem com situações de incerteza. A Teoria do Valor Esperado se predispõe a quantificar a relação risco-retorno dos cenários possíveis gerados por essas obscuridades e, com isso, definir uma tomada de decisão ótima, que será aquela que possuir um maior Valor Esperado.

Para calculá-lo, a matemática é elementar: deve-se fazer uma soma dos possíveis retornos ponderados pelas suas probabilidades de ocorrência. Se o Valor Esperado for positivo, significa que realizar essa aposta é um bom investimento, sendo uma estratégia lucrativa no longo prazo. Em outras palavras, a mensagem é que a remuneração oferecida em caso de sucesso mais do que compensa o risco de perda.

Analogamente, se o Valor Esperado for negativo, pode-se inferir que o possível retorno não compensa o risco incorrido. Já caso seja nulo (zero), o investidor deve se manter indiferente entre apostar ou não.

No intuito de tornar a análise mais palpável e convencer o leitor das implicações da Teoria do Valor Esperado, vale trazer à tona uma situação mais cotidiana. Suponha que uma pessoa faça a seguinte proposta à outra qualquer: “vou jogar essa moeda para cima, caso dê “Cara”, você me paga 10 reais, caso dê “Coroa” eu te pago 5 reais”. Intuitivamente, qualquer cidadão que tenha uma noção básica de matemática certamente rejeitaria a oferta, e isso acontece devido a essa situação possuir, sob a ótica de quem está recebendo a proposta, um Valor Esperado negativo.

Considerando que a moeda possui 50% de chance de cair em cada lado, o cálculo do Valor Esperado, conforme explicado anteriormente, será o seguinte:

-10 * 50% + 5 * 50% = -2,5 (ou seja, negativo)

Um modo ainda mais intuitivo de enxergar essa conta e notar como o Valor Esperado se materializa na vida real é pensar que, caso a moeda seja lançada 100 vezes, a tendência é que caia metade das vezes para cada lado. Assim, a pessoa pagaria 10 reais em 50 oportunidades e receberia 5 reais nas outras 50, chegando a um prejuízo de 250  (-500 + 250) reais, que nada mais é do que o Valor Esperado “unitário” (-2,5 encontrado acima) multiplicado pelo número de lançamentos (100).

Nesse caso, sem fazer maiores pressupostos sobre o nível de aversão ao risco do indivíduo, é fácil notar que ele deveria passar a aceitar a oferta somente quando o valor recebido em caso de vitória ultrapassasse o montante que ele perde em caso de derrota, pois ambos os eventos são igualmente prováveis.

Mas e no caso das apostas, a partir de qual remuneração vale a pena fazer o investimento? A resposta é, mais uma vez, a partir do momento em que o Valor Esperado for  positivo, e isso acontecerá quando tal sentença for satisfeita:

  odd*P1+0*(1-P1)-1>0   (1)

           P1 / odd    (2)

Repare que a lógica é exatamente a mesma de antes:

A variável P1 é a probabilidade de o apostador acertar seu palpite.

A odd é o quanto ele receberá em caso de acerto.

(1-P1) é a probabilidade de o apostador errar seu palpite (afinal, só há essas duas hipóteses: errar ou acertar, logo as duas probabilidades somadas têm que ser iguais a 100%).

Zero é o recebimento em caso de erro.

-1 se refere ao real que, independente do resultado (e por essa razão não está multiplicando nenhuma probabilidade), será investido na aposta.

Isolando P1, chega-se, enfim, na relação mais importante de todo o texto, a qual está explicitada na inequação (2). O seu significado é que para o Valor Esperado ser positivo (e, consequentemente, o investimento ser lucrativo), a probabilidade de ocorrência do evento deve ser maior do que o inverso da sua odd oferecida.

Ou seja, se a casa de apostas está oferecendo uma remuneração de odd = 4 na vitória do Nadal sobre o Federer, o investidor deve aplicar o seu dinheiro somente caso acredite que a probabilidade de ocorrência para este evento seja maior do que 25% (=1/4).

Portanto, a grande conclusão do artigo é que, a partir desta paridade inversamente proporcional entre odd e probabilidade, é possível extrair uma “regra de bolso” para entender a relação risco-retorno no mercado de apostas esportivas como um todo. Em suma, tal regra fornece uma espécie de “probabilidade fronteira” a partir da qual a aposta deve se tornar lucrativa e, dessa maneira, pode servir como um guia para todos os investidores que desejarem adentrar neste universo.

Como comentário final, vale salientar que, evidentemente, tal raciocínio de nada serve caso o investidor não tenha conhecimento e habilidade para estimar as probabilidades dos resultados esportivos com precisão. Na verdade, é justamente aí que mora toda a magia: como em qualquer outro investimento, terão mais sucesso aqueles com mais talento e dedicação.

Roberto Yazeji – Graduado em Economia pela PUC-RJ e apaixonado pelo mundo dos investimentos de maneira geral.
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