A economia brasileira vive sob a lógica do axioma do “Super” Senhor Ministro da Economia, Paulo Guedes. Desde o processo eleitoral, em 2018, o autoproclamado liberal Paulo Guedes declara sistematicamente seus raciocínios econômicos chicaguistas (ou seja, da Escola de Chicago) acerca da realidade e dos problemas brasileiros.
De acordo com o dicionário Michaelis, o termo axioma refere-se a um princípio, ou uma máxima, que é universalmente aceito, apesar de não ser necessariamente comprovado e testado. Isso quer dizer que é uma verdade sem qualquer comprovação.
Nesse contexto, qual é o axioma do Senhor Paulo Guedes? Em várias ocasiões, Guedes tem declarado que o grande problema da economia brasileira são os sucessivos déficits da Previdência Social. Segundo ele, são esses déficits previdenciários que desequilibram as contas públicas em todas as esferas do poder nacional – da União até os municípios. E, é esse desequilíbrio nas contas públicas nacionais que corrói a confiança do mercado na economia brasileira, levando a atual recessão econômica.
Essa análise do Senhor Paulo Guedes pode até estar correta parcialmente. O problema é a sua solução – que já se converteu em um axioma sem qualquer comprovação teórica (na ciência econômica) e prática (nas experiências internacionais).
Dessa maneira, o axioma do Senhor Paulo Guedes é de que bastaria aprovar a reforma da Previdência Social para que a economia brasileira reencontrasse – via os sinais mágicos do equilíbrio fiscal – os caminhos do crescimento ou do desenvolvimento econômico. Em outras palavras, a reforma da Previdência Social acabaria com os déficits públicos, que acabaria com os desequilíbrios fiscais, que acabaria com a desconfiança do mercado na economia nacional e, que – por fim – acabaria com a recessão econômica.
Talvez, o Senhor Paulo Guedes tenha faltado algumas aulas do PhD na Universidade de Chicago, ou tenha simplesmente esquecido de ler alguns livros e papers sobre modelos de crescimento ou desenvolvimento econômico.
Em qual lugar do mundo acadêmico, ou em qual autor prestigiado, ou em qual escola do pensamento econômico, o Senhor Paulo Guedes aprendeu que o desempenho econômico está em função de uma reforma da previdência?
Na prática, o atual Ministro da Economia não tem qualquer projeto de desenvolvimento nacional, ou qualquer política explícita de crescimento econômico. Desde a posse – em janeiro – sua tábua de salvação econômica tem sido exclusivamente a reforma da Previdência Social, mesmo após a sua aprovação. Inclusive já chegou a declarar diversas vezes que sairia do governo caso sua agenda reformista não tivesse apoio no Congresso Nacional.
Mas, qual foi o país no mundo que resolveu uma recessão econômica com uma reforma previdenciária? Ou, que resolveu o problema do desemprego somente com o equilíbrio fiscal? Ou, que melhorou a confiança dos mercados com superávits públicos?
Teoricamente, qual é o modelo de crescimento econômico que o Senhor Paulo Guedes utiliza? Ou, qual o projeto desenvolvimentista que ele adota? Infelizmente, não encontrei em nenhum Manual de Economia, até mesmo nos empoeirados manuais chicaguistas, a linha de raciocínio utilizada pelo Senhor Paulo Guedes. Será que ele utiliza um manual próprio? Ou, está confundindo os Manuais de Finanças com os Manuais de Economia?
É, por isso, que a sua solução – para o problema econômico brasileiro – não passa de um axioma sem qualquer comprovação teórica e prática. Vejamos as razões:
- A reforma da Previdência Social é importante no atual contexto nacional, porém não é a tábua de salvação da economia. Isso quer dizer que são as transformações sociais, demográficas (menos jovens, mais idosos) e produtivas que exigem uma reforma previdenciária. Os problemas na contabilidade atuarial não devem ser os determinantes da reforma, até porque é muito difícil encontrar um país civilizado que tenha as contas previdenciárias em pleno equilíbrio.
- É verdade que a Previdência Social no Brasil consome grande parte do orçamento público. Anualmente, o sistema previdenciário gasta mais do que arrecada. Mas, o déficit previdenciário é um problema econômico? É o déficit público que gera a recessão econômica? Estados Unidos, Japão e Alemanha operam continuamente em déficit – apenas para citar três exemplos. Logo, o argumento do déficit é um mito! Ou melhor, é um mito propalado pelos mercados financeiros para subjugar economias em desenvolvimento aos interesses das economias avançadas. Vale lembrar que o Senhor Paulo Guedes tem um extenso currículo nos mercados!
- Nenhum país do mundo resolveu uma recessão com reforma previdenciária. Na prática, recessão econômica se resolve com investimentos públicos, tecnologia e inovação, mão-de-obra qualificada, consumo das famílias, comércio exterior, etc. Ou seja, recessão econômica se resolve com incentivos às atividades produtivas. Após a crise de 2008, os Estados Unidos implantaram essa cartilha econômica, com mais gastos públicos e com mais investimentos na atividade produtiva. Nesse sentido, qual é a agenda produtiva do Senhor Paulo Guedes? Infelizmente, não encontrei qualquer documento a respeito…
- Nenhum modelo econômico – do mais ortodoxo ao mais heterodoxo – apresenta a reforma previdenciária como caminho para o crescimento e o desenvolvimento econômico. Por exemplo, o modelo de Robert Solow (Prêmio Nobel em 1987), que é considerado neoclássico, propõe que o crescimento econômico (ou seja, a produção agregada de um determinado país) está em função do capital físico (ou capacidade instalada) e da mão-de-obra agregada. Mais uma vez, surge a dúvida: qual é o plano de investimento público do Senhor Paulo Guedes? Qual é o plano de incentivo para os investimentos privados? Qual a política de financiamento para as atividades produtivas consideradas estratégicas? Infelizmente, mais uma vez, não encontrei qualquer documento que apresente um caminho…
- Nenhum projeto de desenvolvimento econômico (ou qualquer que seja o adjetivo utilizado: socioeconômico, sustentável, inclusivo, regional, nacional, etc.) tem na reforma previdenciária a sua tábua de salvação. Por exemplo, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) prevê ações para a melhoria do emprego e da renda, da saúde, da educação, da desigualdade, da moradia, etc. O desenvolvimento econômico, assim, é muito mais do que uma simples reforma previdenciária, é uma alteração completa do bem-estar econômico e social. Nesse caso, qual é o projeto de desenvolvimento em curso pelo atual governo? Qual é a preocupação do Senhor Ministro da Economia Paulo Guedes em alocar recursos econômicos para as áreas prioritárias do desenvolvimento? Infelizmente, nada foi encontrado…
Por fim, cabe destacar que, enquanto, o Senhor Paulo Guedes vive dentro de seu axioma econômico, o Brasil mergulha em mais uma recessão econômica: com desemprego, com queda na produção, com falência de indústrias, com aumento da desigualdade social, etc. Ou seja, o Brasil está sem rumo para o crescimento ou o desenvolvimento!
Filipe Prado de Macedo da Silva
Professor Efetivo Adjunto do Magistério Superior Federal no Instituto de Economia e Relações Internacionais (IERI), na Universidade Federal de Uberlândia (UFU).
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