A insídia do Imposto Único

Logo após a aprovação da Reforma da Previdência na Câmara, começou o alarde sobre a Reforma Tributária. E dentro da Reforma Tributária existe uma pauta importantíssima: a instituição de um Imposto Único.  

Todos nós queremos a desburocratização da economia brasileira – já que isso é condição sine qua non para o desenvolvimento econômico -, mas quando fazemos isso sem analisar bem as reações a longo prazo, podemos ter consequências bem desagradáveis. Ainda mais quando se trata de políticas públicas, cuja imprevisibilidade de seus impactos já fora visto centenas de vezes na história econômica global.

A Reforma Tributária proposta por Marcos Cintra, ex-secretário da Receita Federal, consistia num imposto sobre movimentações financeiras que seria pago em qualquer transação bancária. O projeto pretendia tributar toda e qualquer transação financeira, não somente as transações que geram riqueza, como renda de trabalho, vendas ou lucro de empresas.

Pagaríamos imposto por qualquer transação ou transferência que fizéssemos. Já não faz sentido taxar transações que produzem algo para o país e a sociedade, faz ainda menos sentido taxar transações simples que não são produtivas. Ainda, deixando todo o poder de arrecadação e suas regras unicamente com o Governo Federal, o projeto contraria de certa forma o caminho de Revisão do Pacto Federativo que o governo tem defendido.

Essa ideia, que pretendia ser uma espécie de nova CPMF, viria com o nome de Imposto sobre Transações Financeiras (ITF), sendo cobrada automaticamente de quem paga e de quem recebe, ou seja, nas duas pontas da transação.

A CPMF tinha alíquota de 0,38%, consideravelmente pequena, e mal era percebida ao ser descontada em qualquer movimentação bancária, sem aviso, sem burocracia. O ITF, com sua função de substituir cinco impostos (PIS, Cofins, IPI, CSLL e IOF), que equivalem hoje aproximadamente 27% do PIB, teria muito provavelmente uma alíquota bem mais alta que os 0,38% da extinta CPMF.

Isso seria sentido em todos os segmentos do Mercado, principalmente na Bolsa de Valores e mercados de alta liquidez. O investidor teria que lidar com esses impostos nas transações além de todas as outros custos, burocracias, despesas além do próprio Imposto de Renda.

O Mercado como um todo perderia sua liquidez, desestimulando categoricamente qualquer tipo de negociação. Não é necessário dizer o quanto essas mudanças inviabilizarão a lenta recuperação da economia brasileira.

Natural de todos os mercados, a economia acabaria se flexibilizando de todos os modos possíveis para evitar pagar o ITF. Seja de modo simples evitando transações desnecessárias, eliminando todos os tipos de intermediação financeira ou outros modos mais criativos que ainda sequer podemos imaginar.

Consequentemente a arrecadação cairia, o governo tentaria corrigir isso aumentando ainda mais a alíquota o que apenas elevaria ainda mais essa fuga das transações, fazendo no longo prazo a necessidade de uma nova reforma tributária.

O Imposto sobre Bens e Serviços – IBS

Já o projeto de Bernard Appy apresentado na Câmara, apoiado por Rodrigo Maia, procura simplificar especificamente a taxação sobre a produção de bens e serviços.

Neste projeto cinco impostos (IPI, ICMS, ISS, PIS e Cofins) seriam unificados no Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Este imposto seria de alíquota única, não-cumulativo e seria somente sobre o valor adicionado. Essa transição ocorreria em um período de 10 anos.

O IBS é baseado no Imposto sobre o Valor Adicionado (IVA). Modelo aplicado em diversos países da Europa e na América do Norte, sendo cobrado nas diferentes etapas da produção e da comercialização de bens e serviços.

O IVA, portanto, é um tributo neutro, independendo da forma como está organizada a cadeia de produção e circulação, de modo que o imposto pago pelo consumidor na venda seja exatamente ao que foi recolhido ao longo de toda a cadeia de produção e comercialização, também evitando a bitributação.

Não onera as exportações, pois contará com mecanismo para devolução ágil dos créditos acumulados pelos exportadores. Também não onera os investimentos, visto que o crédito instantâneo será assegurado ao imposto pago na aquisição de bens de capital. Garante também, o exercício da autonomia dos entes federativos nas operações interestaduais e intermunicipais.

Claro, o IBS não resolve todos os problemas do sistema tributário brasileiro, mas simplifica e desburocratiza um dos setores mais importantes dessa reforma. Outros projetos de simplificação de outros tributos deverão ser estudados e apresentados, especialmente os impostos sobre Renda.

O governo parece sinalizar apoio ao projeto de Bernard Appy, mas devido a toda complexidade do tema e de todos os trâmites da política brasileira, não é possível dizer que o projeto já está fechado. Só nos resta acompanhar, para evitar qualquer insídia.

 

Michael Sousa

Mestre em Comércio Internacional pela European Business School de Barcelona, MBA em Gestão Estratégica pela FEA-RP USP, é graduado em Ciência da Computação e especialista em Strategic Foresight. Possui extensão em Estatística Aplicada pelo Ibmec e em Gestão de Custos pela PUC-RS. Trabalha com Gestão de Projetos, Análise de Dados e Inteligência de Mercado. Entretanto, rendendo-se aos interesses pelas teorias freudianas, foi também estudar Psicanálise no Instituto Brasileiro de Psicanálise Clínica, e especializar-se no assunto e na clínica. Quando não passa seu tempo livre tentando desenvolver seu péssimo lado artístico, encontra-se estudando o colapso político-econômico das nações ou lendo vagos e curiosos tomos de ciências ancestrais.
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