A crise pós-pandemia

Os índices econômicos caem em todo o mundo com os sinais de que as crises energéticas podem não ser pontuais e a tendência inflacionária global não demonstra arrefecimento, pelo contrário, vem se tornando cada vez mais intensa e constante.

Na Europa, o gás natural é o cerne da crise energética. É o fator fundamental da matriz energética em todo o continente, sendo a principal fonte de aquecimento das residências por lá, um continente prestes a receber o inverno (o que deve piorar ainda mais a situação); o preço da commodity vem aumentando consideravelmente nos últimos meses.

A demanda por energia tem aumentado após o avanço da vacinação nos países europeus e a retomada econômica, com a reabertura dos comércios e retorno da produção e da indústria.

A oferta de energia não está se adaptando com a rápida aceleração da demanda, e isso afeta os preços, aumentando as contas e pressionando a inflação em toda a União Europeia.

No Reino Unido, além de enfrentar dificuldade na distribuição dos combustíveis pela falta de motoristas de caminhão (o que fez diversos postos ficarem desabastecidos, e o governo precisar usar o exército para fazer a distribuição), também tem enfrentado a alta nos preços do gás natural, refletindo nas contas de luz e nas projeções de inflação.

Na China, o carvão, que é o principal componente de toda a matriz energética chinesa, apesar de estar em um processo guiado pelo governo para o país se tornar menos poluidor e emissor dos gases do efeito estufa (com leis e mudanças estruturais para tentar diminuir a dependência nesse minério, para tentar substitui-lo por gás natural), não tem dado conta do ritmo da retomada chinesa, com as indústrias possuindo dependência direta desse tipo de energia.

Com a escassez do carvão, regiões do país já começaram a passar por apagões, racionamento e restrições ao uso de energia, fazendo com que as cadeias de suprimentos e fornecimento por toda a China sejam afetadas, e suas projeções reduzidas. Já há informativos de algumas fábricas que suspenderam a produção devido às restrições de uso de energia ou apagões.

As previsões de crescimento do PIB chinês já começaram a ser revistas e, se esse cenário se mantiver, afetará de forma mais contundente a retomada da economia em todo o mundo. Isso tudo sem citar a crise no setor de construção civil chinês, evidenciada com os problemas financeiros da Evergrande.

no Brasil, a crise hídrica é a origem da crise energética. A ausência de chuvas, ligada às mudanças climáticas, levou os reservatórios das usinas hidrelétricas aos níveis mais baixos em 90 anos. Alinhado ao começo da reabertura e processo de retomada pós-pandemia, o que causou alta no consumo de energia, a escassez de água para energia só intensifica a crise.

Sendo a principal fonte de energia do país, a baixa produção das hidrelétricas precisou ser compensada com o acionamento das usinas termelétricas, que utilizam o gás natural e tem um custo muito maior, fazendo com que as contas de energia disparassem, o que também dificulta a retomada econômica e pressiona diretamente a inflação. E tudo o mais se intensifica no Brasil com as instabilidades políticas, necessidade urgente de reformas, problemas fiscais e com precatórios e início de um ano de eleição presidencial iminente.

Nos Estados Unidos, com a inflação fortemente pressionada, aumento acentuado dos preços do petróleo e indicativos de uma possível desaceleração global afetou negativamente os índices da economia. O Federal Reserve já indicava a redução dos estímulos em alguns meses, mas a ideia de uma antecipação a essa redução está cada vez mais forte no radar do mercado, e a possibilidade do aumento dos juros na economia americana se torna cada vez mais factível.

O possível aumento dos juros nos EUA, diferentes crises energéticas nos principais blocos econômicos, o intenso movimento inflacionário, o déficit fiscal e as instabilidades políticas que todos esses movimentos podem causar, incitarão uma série de desinvestimentos por todo o mundo e parecem só intensificar um movimento de desaceleração econômica que, infelizmente, já vem sendo perceptível há algum tempo.

 

Michael Sousa

Mestre em Comércio Internacional pela European Business School de Barcelona, MBA em Gestão Estratégica pela FEA-RP USP, é graduado em Ciência da Computação e especialista em Strategic Foresight. Possui extensão em Estatística Aplicada pelo Ibmec e em Gestão de Custos pela PUC-RS. Trabalha com Gestão de Projetos, Análise de Dados e Inteligência de Mercado. Entretanto, rendendo-se aos interesses pelas teorias freudianas, foi também estudar Psicanálise no Instituto Brasileiro de Psicanálise Clínica, e especializar-se no assunto e na clínica. Quando não passa seu tempo livre tentando desenvolver seu péssimo lado artístico, encontra-se estudando o colapso político-econômico das nações ou lendo vagos e curiosos tomos de ciências ancestrais.
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