Eleições – Tirar o financiamento empresarial não mudou o problema

Caio Augusto

Recentemente, tivemos uma alteração nas regras de doação eleitoral: até então, era possível que pessoas físicas e empresas realizassem doações a seus partidos e candidatos de predileção; após esta mudança, apenas pessoas físicas podem fazer isso – além do mais, foi implementado um teto para o custo de campanhas eleitorais [1]. A ideia dessa reforma eleitoral é a de limitar o poder que as empresas teriam sobre as campanhas – que poderiam, como a Lava Jato mostrou, refletir-se em direcionamentos escusos após o processo eleitoral.

Então, agora somente pessoas podem fazer doações para campanhas eleitorais. A pergunta que não quer calar é simples: funcionou? Bem, não é o que mostram diversas reportagens que se referem a dados colhidos pelo TSE, todas do mês de setembro:

report1

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report2

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report3

[4]

Quais os prováveis motivos dessas ocorrências?

  • A política está altamente desacreditada no país – e não é de se imaginar que as pessoas decidam contribuir com campanhas políticas neste momento;
  • Os custos dessas campanhas, mesmo agora tendo limites, seguem existindo;
  • O interesse por parte de quem quer chegar ao – ou continuar no – poder segue existindo, independente do distanciamento da população deste tema.

A combinação destes três fatores sinaliza para um incentivo econômico enorme de se realizarem doações de maneiras supostamente legais – mas que envolvem meios escandalosos, como o uso de CPF de pessoas falecidas e a doação de valores e prestação de serviços na casa das dezenas de milhares de reais por pessoas inscritas no Bolsa Família (que, pela definição do programa, são pessoas próximas da linha da pobreza).

A intenção era a de reduzir as doações irregulares e a participação de empresas nos processos eleitorais. O resultado foi uma continuidade das doações – agora de maneira no mínimo exótica. Reformas eleitorais costumam ter intenções bastante nobres e geralmente ocorrem em momentos de forte apoio popular e político – com operações como a Lava Jato em ação, seria considerado louco o político que discordasse da tese alarmada de que as empresas subvertem seus interesses via contribuição de campanha –, mas pecam por desejarem (e não alcançarem, como estamos vendo agora) resolver todos os problemas com medidas simples e diretas que não tem este poder.

Trata-se de um tema delicado que, como muitas coisas em nosso país, infelizmente teve um tratamento rápido, indolor e ineficaz. Gilmar Mendes acertou quando cravou que esta mudança formaria um “laranjal de doações” [5].

  Notas: [1]          https://www.eleicoes2016.com.br/quais-sao-as-regras-da-doacao-para-campanha-eleitoral/ [2]          http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2016/09/09/tse-encontra-indicios-de-irregularidade-em-doacoes-que-totalizam-r-266-milhoes.htm [3]          http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/noticia/2016/09/tse-detecta-40-mil-doacoes-com-indicios-de-irregularidades.html [4]          http://www1.folha.uol.com.br/poder/eleicoes-2016/2016/09/1817869-justica-eleitoral-identifica-93-mil-que-doaram-sem-possuir-renda-compativel.shtml [5]          http://www1.folha.uol.com.br/poder/2016/09/1813931-mendes-afirma-que-laranjal-em-doacoes-eleitorais-esta-se-confirmando.shtml  

Caio Augusto

Formado em Economia Empresarial e Controladoria pela Universidade de São Paulo (FEA-RP), atualmente cursando o MBA de Gestão Empresarial na FGV. Gosta de discutir economia , política e finanças pessoais de maneira descontraída, simples sem ser simplista. Trabalha como diretor financeiro de negócios familiares no interior de São Paulo e arquiva suas publicações no WordPress Questão de Incentivos. É bastante interessado nos campos de políticas públicas e incentivos econômicos.
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